Encontrar um parceiro: desejo ou necessidade?

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Não é a mesma coisa escolher um companheiro porque o deseja com liberdade e sem pressa ou porque tem medo de ficar sozinho. Neste artigo o psicólogo Marcelo Ceberio nos fala sobre esse tema.

Quando você deseja encontrar um parceiro, precisa estar preparado para pesquisar. Embora pareça óbvio, muitas pessoas fazem exatamente o oposto. O medo, a imaturidade, a relutância em se comprometer e muitos outros motivos atuam como fatores de boicote no processo de escolha de um parceiro.

É importante distinguir o desejo de formar um casal da necessidade imperiosa de ter um companheiro. Este último surge da dificuldade de estar sozinho consigo mesmo e da busca desesperada por alguém que possa preencher esse vazio.

Encontrar um parceiro e solidão pessoal

A solidão pessoal parece ser o motivo que leva as pessoas a encontrar um parceiro. Mas este não é um bom começo quando se considera o solidão uma condição negativa.

Geralmente estar sozinho está associado a uma desvalorização da própria condição. Você se sente indesejado, deixado de lado, rejeitado, marginalizado, rejeitado, abandonado. Essa condição está associada à tristeza, angústia e depressão.

Essa forma de pensar é observável ao longo da história, desde o preceito bíblico que diz que não é bom que o homem fique sozinho até o verso de uma canção icônica dos anos 60 que diz Estou muito solitário e triste neste mundo abandonado.... A solidão é desaprovada não só para quem a vivencia, mas também a nível social.

Se a solidão tem tantos aspectos negativos, quem pode querer ficar sozinho? Contudo, não existe uma condição absoluta de solidão; você pode se sentir sozinho mesmo se estiver com alguém.

Solidão no casal

Uma das solidões mais difíceis de enfrentar é a solidão sentida no casal. Esse tipo de solidão cria inúmeras deficiências emocionais. A isto devemos acrescentar o contexto em que vivemos.

Com o passar dos anos, o contexto social em que se vive lembra à pessoa que permaneceu solteira, que não tem companheiro, que não se casou, que não constituiu família, que não tem filhos, etc. Isto é especialmente verdade quando a maioria dos seus amigos é casada, espera filhos ou já tem família. Essas situações são como um espelho que mostra o que você quer e não tem.

É este contexto que aumenta a imagem trágica da solidão e tem forte impacto autoestima do povo. Confrontamos nossas próprias falhas com o que não temos. É como se você tivesse uma dívida pendente. Essa condição é vivenciada como insuportável e no final tenta-se escapar da solidão o mais rápido possível.

O que acontece é que nesta fuga desesperada da solidão muitas vezes tendemos a escolher uma pessoa que possa preencher essa carência, esse sentimento de solidão. Isso nos leva a criar fantasmas de projeções ideais nas quais o outro não é realmente outra pessoa, mas uma espécie de grande tela na qual são projetadas nossas necessidades.

Tal necessidade mostra as nossas deficiências. Porém, não ter companheiro não significa necessariamente ter deficiências. Geralmente, as pessoas que apresentam deficiências estabelecem relações afetivas baseadas na dependência, pois não conseguem conviver consigo mesmas e buscam referências no casal. Também tentamos preencher um vazio pessoal buscando o reconhecimento dos outros.

É importante ter em mente que esta necessidade gerará uma ansiedade que produz certos comportamentos. Esta escalada no espelho - causada muitas vezes pelo medo de ficar sozinho, pela falta de reconhecimento e pela baixa autoestima - leva à escolha de um parceiro com quem é difícil ter um relacionamento profundo.

Encontrar um parceiro por necessidade: quais são as consequências?

Quando você é forçado a encontrar um parceiro por necessidade, você faz uma escolha que poderíamos definir como desesperada. Isso porque o sujeito coloca o outro em um pedestal em busca do reconhecimento deste. É uma das consequências do mau amor e constitui o fundamento da alienação entre os membros do casal.

Estas escolhas desesperadas são comparáveis ​​a profecias autorrealizáveis. Tentamos tanto não ficar sozinhos que acabamos ficando sozinhos novamente. Esses casais estão destinados a não durar muito, trazendo o sujeito de volta à situação inicial de solidão.

Outra versão da solidão

Porém, existe outra versão de solidão que não tem conotação negativa e que melhora a nossa autoestima. É o que nos permite sentir-nos bem connosco próprios e aproveitar o tempo que passamos sozinhos.

Uma pessoa com boa autoestima é interdependente e não ter companheiro ainda permite que ela compartilhe seu precioso tempo. Normalmente são pessoas que não estão estressadas pela ansiedade ou desespero e que aproveitam o tempo e se valorizam.

Ter essa consciência e valorizar o seu tempo significa escolher cuidadosamente quando aceitar um convite ou decidir conscientemente quando passar um tempo com alguém. Quando você se sente bem consigo mesmo, você aprecia e valoriza seu tempo. A pessoa torna-se, portanto, seletiva porque não quer perder tempo desnecessariamente. Não se trata de ficar na defensiva, é apenas uma forma de cautela.

Em última análise, o primeiro parceiro que temos é a solidão, que nada mais é do que o uma condição sem a qual não ter um relacionamento com outra pessoa.

Se você deseja escolher um bom parceiro, primeiro deve estabelecer uma relação saudável com a sua solidão. Isso significa ter um relacionamento saudável consigo mesmo.

Escolha um parceiro porque você quer

Escolha uma pessoa a partir de um desejo adulto maduro e sem se deixar levar por neurose dá-nos a oportunidade de encontrar o parceiro observando tanto os aspectos positivos como os negativos. Gostaríamos de sublinhar que estes não são aspectos positivos ou negativos em si, mas aplicam-se a cada pessoa. Eles respondem, portanto, a necessidades pessoais e subjetivas.

Encontrar um parceiro porque você quer implica aceitar sua solidão. Se me sinto bem comigo mesmo, terei que fazer uma escolha cuidadosa quando quiser compartilhar meu precioso tempo com outra pessoa.

Aceitar a solidão e sentir-se bem sozinho é o ponto de partida para escolher um bom parceiro. Isso também significa ter cuidado ao escolher um parceiro em determinado momento de nossa vida.

No entanto, extrema cautela pode nos levar a ser muito seletivos em nossa pesquisa. Na verdade, não é incomum passar de uma posição defensiva para uma fobia de relacionamento. Nestes casos você corre o risco de ficar sozinho (solidão seja cauteloso posição defensiva fobia = solidão).

Pode parecer um imperativo categórico, mas se você escolher seu parceiro por necessidade, você corre o risco de se encontrar em um relacionamento tóxico e no jogo do amor ruim. Não é a mesma coisa que querer um parceiro ou precisar desesperadamente de um. Existe uma diferença notável entre uma pessoa que deseja alguém e uma pessoa que precisa de alguém.

Para explicar com uma metáfora, necessidade é como passar três dias sem comer e sentar-se num restaurante. O desespero leva-nos a comer a primeira coisa que temos à nossa frente, por exemplo o pão que o empregado acaba de nos trazer. Não esperamos pelo menu e quando nos trazem escolhemos o prato que pode ser preparado mais rapidamente. Pelo contrário, se comemos um lanche quando estamos no restaurante pediremos primeiro um aperitivo e depois escolheremos com calma o prato que mais gostamos.

Sentir-se bem consigo mesmo e com a sua solidão, embora não sejam indicadores de uma escolha correta, permite-nos escolher livremente e sem pressa. Isso significa que você escolhe partir de uma simetria relacional a partir de uma condição de igualdade. Se estivermos desesperados, porém, seremos facilmente manipulados.

Idealização e visão realista

A escolha de um parceiro implica a seleção de apenas um sujeito (a pessoa que escolho) mas com duas implicações pessoais. Na primeira, a pessoa escolhida é idealizada e apenas são observadas as virtudes que levamos em consideração ou atribuímos a ela. No segundo você escolhe a pessoa como ela realmente é com seus pontos fortes e fracos.

Porém, é bom ressaltar que no processo de formação de um relacionamento de casal a idealização corresponde ao primeiro período enquanto a visão realista assume uma fase posterior. Porém, isso nem sempre acontece porque implicaria ver o casal na sua totalidade; em seus aspectos positivos e negativos.

Para passar da idealização para uma visão realista é necessário aceitar e compreender os aspectos do parceiro que não são considerados positivos (virtudes defeitos = ser humano real).

Quem escolhe por necessidade considera apenas os aspectos do outro que satisfazem suas próprias necessidades. Você só vê o que deseja ver e elimina o resto. Desta forma, nega-se a existência de aspectos que não agradam e atribuem-se ao parceiro características que ele não possui e nas quais se modela o ideal do casal que se deseja formar.

Quem quer formar um casal e se conhece bem é mais objetivo na escolha. Se soubermos quem somos e o que queremos, entenderemos melhor quem realmente é o parceiro e o que ele representa para nós. Assim ele será uma pessoa real e não idealizada.

Quem escolhe a partir do desejo vê o outro em sua totalidade, enquanto quem escolhe por necessidade leva em conta apenas os aspectos idealizados.

É óbvio que quem prefere o equilíbrio entre os aspectos positivos e negativos irá considerar mais os primeiros na hora de se apaixonar. o que permitirá um certo grau de sucesso nos relacionamentos amorosos. Porém, não é incomum encontrar pessoas que, apesar da prevalência de aspectos negativos, insistem em querer estar com uma pessoa, levando o relacionamento a níveis extremos.

Nestes casos vivemos à espera de respostas ideais e sentimos frustração quando as respostas do nosso parceiro não coincidem com as que esperávamos. São pessoas que se apaixonam por um fantasma construído a partir de necessidades pessoais. Eles geralmente descontam seu desconforto no parceiro.

São sujeitos que sofrem porque vivem em utopia adaptar o outro aos seus próprios desejos moldá-lo de acordo com as necessidades pessoais sem entender quem ele é. O companheiro, por sua vez, sente-se inadequado diante dos pedidos do outro: ser alguém que não é.

Um relacionamento amoroso pode se transformar em um relacionamento. É a transição do amor ideal (ou paixão) para o amor verdadeiro baseado na criação de um vínculo emocionalmente maduro. Pessoas que se amam concordam tacitamente sobre o sentimento que têm sobre os motivos desse amor e sobre quais são os aspectos do caráter do outro que não alimentam esse sentimento. É assim que se forma um casal.

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